Não dá pra ficar em cima do muro

 Não dá pra ficar em cima do muro

Luz_Caminhada

20º Domingo do Tempo Comum

Primeira Leitura (Jr 38,4-6.8-10)
Salmo 39
Segunda Leitura (Hb 12,1-4)
Evangelho (Lc 12,49-53)

Por Joilson de Souza Toledo, FMS.*

Continuamos nossa caminhada pelo evangelho de Lucas. E, para acolher bem as provocações e os apelos que as leituras de hoje nos fazem, convém “dar uma olhadinha” no texto que vem antes (Lc 12, 35-48), e no que vem depois (Lc 12, 54-59). Nas partes que envolvem o evangelho de hoje vemos em destaque o discernimento, a responsabilidade, a vigilância. É dentro deste contexto que também deve ser visto este texto.

A comunidade de Lucas, ao fazer memória do Mestre, mais de 50 anos depois da morte e ressurreição de Jesus, não perde de vista que a vida de Jesus o levou a cruz! Isso mesmo… Em sua vida Jesus fez escolhas, tomou posição diante da realidade, e isso fez com que os governantes de seu tempo o condenassem a morte de cruz. Quem escolhe seguir o Mestre é convidado a perfazer suas escolhas e ter disposição para o mesmo destino.

A imagem do fogo dentro da tradição bíblica, em especial nos profetas, nos remete ao julgamento de Deus: o fogo purifica, consome, testa… Em outras palavras, no contato com ele, só fica o que tem mais resistência. Assim o povo daquela época imaginava o “ponto final da história humana”. O batismo remete a uma imersão nas águas profundas da morte. O seguimento a Jesus é um convite a sair da superficialidade e fazer um mergulho na realidade. É neste mergulho que se encontra a Deus. O sagrado não é procurado na calmaria da alienação, mas em meio a conflitividade e simplicidade do cotidiano, na consequência das escolhas.

Ao olhar estes textos, algum desavisado poderia imaginar, então, que Jesus veio trazer a confusão; ou ainda, que imagens bíblicas como estas podem justificar as práticas intolerantes daqueles que não têm mais o que fazer senão encontrar defeitos nos outros; ou dizer que, quem é diferente vai para inferno. O caminho é bem outro…. Não dá para cair numa leitura fundamentalista. O texto tem que ser olhado no todo. No Evangelho de Lucas lemos que Jesus é consagrado para anunciar a Boa Notícia aos pobres (Lc 4, 18); que Deus é misericórdia (Lc 15); que o Reino de Deus está no meio de nós (Lc 10,9.11; 16,16; 17,20-37). É no horizonte do jeito de Jesus, apresentado pela comunidade de Lucas, que precisamos entender os conflitos retratados no Evangelho.

“Com olhos fixos em Jesus” (Hb 12,2) somos convidados a perfazer seu caminho de paixão pelo Reino! Esta entrega à causa do Reino – e não às picuinhas ou fofocas – nos leva a viver conflitos. O cristão não procura os conflitos, mas, como o profeta Jeremias (Jr 38,4-6.8-10), e como a nuvem de testemunhas (Hb 12,1) apresentada na carta aos hebreus, se dispõe a viver os que aparecem na vida como consequência da opção pelo Reino.

Neste mês, falar de vocações sem falar de ter coragem de assumir os conflitos é até romântico, mas, pouco cristão. Ser igreja não é viver uma calmaria de quem não tem nenhum problema porque Deus resolve tudo, mas,é cultivar a disposição daqueles que acreditam na providência e que assumem em seu cotidiano as consequências de seu batismo. Jesus não veio trazer a calmaria, mas, a paz inquieta do Reino; que queima, que arde, que desafia a mim e a você a fazer escolhas pouco ou nada confortáveis. A divisão que o evangelho nos convida é nos posicionar a favor da vida, onde a vida é ferida, onde a vida deve ser anunciada e defendida.

Seguir Jesus é escolher. Não é possível se esconder atrás das opções da família, do grupo, dos amigos, de quem tá perto, da maioria. Cada um de nós é convidado a pensar: no que eu acredito? Quais apelos que reconheço? Quais são as exigências para o seguimento de Jesus nos cenários e contextos nos quais estou inserido?

É bem provável que a comunidade lucana estivesse passando por um momento conflituoso. Vivendo um cenário que convidava as pessoas a se posicionarem. Neste contexto, eles e nós temos como horizonte a cruz: sinal de amor e possibilidade de quem se arrisca. “Não dá para ficar em cima do muro”! O que você quer? Seguir Jesus? Então, atenção!!! Que este tempo vocacional seja um período oportuno para você reconhecer apelos e crescer na disposição de abraçar as consequências que brotam do seguimento de Jesus.

As leituras deste domingo dão um tom interessante às conversas sobre vocação que têm marcado a caminhada das nossas comunidades este mês. Porque falar em vocação é falar em se posicionar. É continuar, mas também ter coragem de romper. É rever laços… Que as boas coisas que abraçamos – por causa do Reino de Deus e do Deus do Reino – nos impulsionem a viver, com audácia e ternura, o que vier pela frente.

 

*Irmão Marista, assessor da PJ na paróquia Nossa Senhora dos Navegantes, Barra do Jucu, Vila Velha/ES.

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